terça-feira, 28 de julho de 2009

ANO SACERDOTAL



1. Depois de um intenso ano voltado para a figura de Paulo, o grande apóstolo e estafeta de Cristo, agora, o Papa Bento XVI convida toda a Igreja a olhar para o valor do Sacerdócio Ministerial, e, por isso, proclamou o “Ano Sacerdotal”, que decorrerá de 19 de Junho de 2008 a 19 de Junho de 2009. Começou em dia da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus – dia dedicado tradicionalmente à oração pela santificação do clero – e prolongar-se-á durante este ano pastoral, em que se celebra o 150º aniversário da morte de São João Maria Vianney, patrono de todos os párocos do mundo, cuja memória litúrgica celebra-se em 4 de Agosto.

2. Qual a finalidade deste ano? O Papa di-lo na Carta que escreveu em 16 de Junho de 2009, para a proclamação do Ano Sacerdotal: «Este ano pretende contribuir para fomentar o empenho de renovação interior de todos os sacerdotes para um seu testemunho evangélico mais vigoroso e incisivo». Mais do que olhar para o “exterior” da missão sacerdotal, o Papa convida a que os presbíteros se olhem “por dentro”, que redescubram a sua identidade; mais do que olhar para as obras grandiosas que um presbítero possa fazer, é necessário redescobrir aquilo que é específico da sua missão sacerdotal, aquilo que distingue o seu sacerdócio do “sacerdócio comum dos fiéis” (LG 10), que todos nós, baptizados, exercemos.

3. Para ajudar a fazer este exercício de redescoberta, o Papa propõe como exemplo S. João Maria Vianney e elenca vários aspectos da sua vida e virtudes que podem e devem ser imitáveis pelos presbíteros e cristãos do século XXI. Ao longo deste ano sacerdotal iremos passar com mais pormenor em alguns aspectos da vida do patrono dos párocos, mas, nesta primeira abordagem, quero deixar uma breve resenha histórica. Nascido a 8 de Maio de 1786, em Dardilly, João Maria Vianney é o quarto de uma família de seis filhos. Os seus pais cultivam treze hectares de terra. É uma família que pratica o Evangelho a partir da oração em conjunto e do acolhimento aos mais pobres.

Embora sendo muito pequeno, a sua mãe educa-o, pela oração, no amor de Deus e da Virgem Maria. João Maria tem apenas três anos quando rebenta a Revolução Francesa, e sete anos quando as perseguições atingem a sua região. É assim mergulhado, desde muito jovem, no drama de uma Igreja dilacerada e de uma sociedade dividida.

É na clandestinidade que João Maria Vianney, em 1797, faz a sua primeira confissão. É aqui, sem dúvida, que ele – que virá a ser o «homem da reconciliação» -, descobre a importância deste sacramento porque o padre a quem ele se confessa arriscou a vida para o fazer. Espera dois anos para poder fazer a sua primeira comunhão, ainda clandestinamente (é descarregado feno diante da casa onde a missa é celebrada, para desviar as atenções). Espera depois mais dois anos para comungar pela segunda vez. Como não compreender a consciência que tinha da grandeza da Eucaristia e da Reconciliação, quando ele viu padres a arriscar a própria vida para lhe permitir encontrar Deus nos sacramentos? Nos próximos números do nosso jornal iremos reflectir mais aprofundadamente como o Santo Cura d’ Ars vivia e celebrava estes dois sacramentos.

João Maria Vianney vai muito tarde para a escola, sobretudo porque na sua aldeia não havia professor. E só aos dezassete anos é que aprende a escrever. Desde muito cedo quis ser padre, mas foi apenas aos vinte anos que começou os estudos. O pai não estava de acordo, e os estudos ficavam muito caros. Para evitar gastos é o Pároco de Écully que o ensina. Será este, verdadeiramente, o seu mestre espiritual.

Napoleão, que entretanto subiu ao poder, começa a guerra. Tem necessidade de soldados. João Maria é chamado para o serviço militar em 1809, mas fica doente na viagem de partida. Antes de integrar o seu batalhão do exército, deserta, encorajado por um recruta que o guia para a aldeia de Noës, nos montes de Forez. Considerado como desertor, é o seu irmão que parte na sua vez, e não mais voltará a Dardilly. João Maria Vianney guardará para sempre esta ferida do desaparecimento do irmão, sem no entanto lamentar o que fez.

O jovem João Maria retoma os estudos eclesiásticos, com dificuldade. É mandado embora do Seminário Maior de Lyon em 1813, não por falta de inteligência mas por manifesta falta de bases: aprender Teologia em latim e evoluir intelectualmente quando só começou a ler e a escrever aos dezassete anos, não é fácil! João Maria Vianney é um homem inteligente e esperto, com uma intuição invulgar para as coisas de Deus. Embora tendo dificuldade em estudar passa razoavelmente no exame de francês, em Écully, onde o abade Balley continua a assegurar a sua formação. Depois do exame, o Vigário Geral terá dito: «O senhor sabe tanto ou mais que a maior parte dos nossos padres da província».

Em 13 de Agosto de 1815 é ordenado padre em Grenoble, porque, em Lyon, o cardeal Fesh, tio de Napoleão, acaba de deixar a sua diocese, por razões de segurança (a batalha de Waterloo tinha sido em 18 de Junho). É imediatamente nomeado vigário de Écully, ao lado de Mons. Balley, que morreu em 1817.

A 11 de Fevereiro de 1818, é nomeado para Ars, pequena aldeia em Dombes, no Departamento do Ain, instalando-se dois dias depois. Ficará lá 41 anos, até à sua morte no dia 4 de Agosto de 1859. Inicialmente paróquia da diocese de Lyon, Ars passa para a diocese de Belley em 1823, aquando da sua fundação por Mons. Devie.

O seu ministério desenrola-se num contexto de inconstância política: império, monarquia, república e de novo império. A França tem dificuldade em estabelecer a paz. Três revoluções, dois golpes de Estado e dois períodos de terror marcaram a sua história entre 1786 e 1859. No plano religioso, o anticlericalismo manifesta-se nalguns períodos, particularmente em 1830.

Desde o início, João Maria Vianney revela-se um homem empreendedor. Do restauro do relógio da igreja à construção de capelas, passando pela aquisição, em 1824, da casa que se chamará «Providência» para aí fazer uma escola gratuita para raparigas, ou ainda a compra de paramentos litúrgicos para «exprimir a beleza de Deus», tudo é feito no sentido de anunciar e pôr em prática o Evangelho.

No seu ministério, o Cura d’Ars saberá sempre pôr em destaque a primazia de Deus na vida humana. Inicialmente caracterizado por um certo rigor moral no anúncio de Cristo, rapidamente se deixará conduzir pela sua própria vida espiritual e anunciará a grandeza do Amor de Deus e a Sua Misericórdia infinita pelo homem pecador.

Como a Virgem Maria ocupava um grande lugar na sua vida e na sua fé, manda colocar uma imagem da Santíssima Virgem e consagra a sua paróquia a «Maria concebida sem pecado». Ora, estamos em 1836, quer dizer, dezoito anos da promulgação do dogma da Imaculada Conceição!

Uma das originalidades de Ars é que a «peregrinação» começa ainda em vida de João Maria Vianney. Já antes de 1830 muitas pessoas vinham confessar-se ao Cura d’Ars, atingindo dezenas de milhar nos últimos anos da sua vida. Registam-se mais de cem mil peregrinos em 1858. A maior parte do seu dia é passado na igreja, principalmente para as confissões, mas também para a oração, a Eucaristia e a catequese. Apesar da afluência dos peregrinos, mesmo assim não abandona os seus paroquianos, que terão sempre prioridade.

Tornando-se a tarefa do seu ministério cada vez mais pesada, o Cura d’Ars aceita um auxiliar. Depois uma equipa de missionários diocesanos e irmãos da Sagrada Família de Belley vêm ajudá-lo no exercício das suas funções.

Esgotado pelas suas excessivas actividades, o Cura d’Ars fica definitivamente de cama em 30 de Julho. A 4 de Agosto de 1859, às duas horas da manhã, «entra na glória de Deus». Tem setenta e três anos.

A 8 de Janeiro de 1905, João Maria Vianney é beatificado pelo Papa Pio X. A 31 de Maio de 1925, o Papa Pio XI canoniza-o. Torna-se então «S. João Maria Vianney». Mas, para multidões, ele é antes de tudo o «santo Cura d’Ars». A 23 de Abril de 1929 é nomeado padroeiro de todos os párocos.

4. A vida de S. João Maria Vianney é de uma profunda intensidade espiritual! Ao longo deste ano somos convidados a entrar nela, a beber dela, ajudando-nos a atingir a santidade, à qual somos todos chamados, como refere a Constituição Dogmática «Lumen Gentium» do Concílio Vaticano II: «…cada um dos fiéis, seja qual for o seu estado ou classe, é chamado à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade» (n. 40). O Ano Sacerdotal é, em primeiro lugar, um convite a caminharmos mais intensamente na santidade, um caminho que se faz em conversão permanente e dinâmica, morrendo, quotidianamente, para nós mesmos para vivermos mais para o Deus Santo, ajudando os nossos irmãos também a serem santos, não só os presbíteros, mas todos os baptizados.

5. Mas, os fiéis devem usar «as forças recebidas segundo a medida do dom de Cristo, para alcançarem esta perfeição» (LG 40). Estas forças só podem ser recebidas na oração. Por isso, o Ano Sacerdotal é também um convite a rezarmos mais, pedindo ao Senhor que nos ajude a sermos santos; mas, de um modo especial, deve ser um ano de oração dos sacerdotes, com eles e por eles, para que seja um ano de renovação de cada presbítero e de cada presbitério. Seria bom que reavivássemos momentos de Adoração Eucarística pela santificação dos sacerdotes. Rezemos pelo aumento de santas vocações sacerdotais e louvemos o nosso Deus pelas vocações que vai suscitando na Sua Igreja e que a Ele correspondem na generosidade da sua vida. O Presbitério da nossa Arquidiocese de Braga ficou mais rico com a ordenação presbiteral de sete diáconos no passado dia 19 de Julho! Rezemos por estes novos presbíteros e também pelas comunidades que os irão acolher, para que todos dêem as mãos neste caminho alegre, mas também íngreme, da santidade! Seja um tempo para as comunidades rezarem, meditarem e festejarem, prestando uma justa homenagem aos seus sacerdotes; que elas não o vejam como um funcionário das “coisas” de Deus, mas aquele que, à imagem de Cristo Bom Pastor, as serve com dedicação, amor e ternura! Seja um tempo para as comunidades reavivarem a amizade e alegria com os seus sacerdotes e vice-versa!

6. S. João Maria Vianney confiou toda a sua vida e o seu ministério sacerdotal à Virgem Maria, a Mãe do Único e Eterno Sacerdote Jesus Cristo e de todos aqueles que participam do Seu sacerdócio. Confiemos a Ela, à Senhora do Sameiro, este Ano Sacerdotal e os Sacerdotes com uma oração composta por João Paulo II na Exortação Apostólica Pós-Sinodal Pastores Dabo Vobis, que ele escreveu em 1992, sobre a formação dos sacerdotes nas circunstâncias actuais:

Maria,

Mãe de Jesus Cristo e Mãe dos Sacerdotes,

Recebei este preito que nós Vos tributamos

Para celebrar a Vossa maternidade

E contemplar junto de Vós o Sacerdócio

Do Vosso Filho e dos Vossos Filhos,

Ó Santa Mãe de Deus.


Mãe de Cristo,

Ao Messias Sacerdote destes o corpo de carne

Para a unção do Espírito Santo

E salvação dos pobres e contritos de coração,

Guardai no vosso coração

E na Igreja os sacerdotes,

Ó Mãe do Salvador.


Mãe da fé,

Acompanhastes ao templo o Filho do Homem,

Cumprimento das promessas feitas aos nossos Pais;

Entregai ao Pai, para Sua glória,

Os sacerdotes do Filho Vosso,

Ó Arca da Aliança.


Mãe da Igreja,

Entre os discípulos no Cenáculo,

Suplicastes o Espírito

Para o Povo novo e os seus Pastores;

Alcançai para a ordem dos presbíteros

A plenitude dos dons,

Ó Rainha dos Apóstolos.


Mãe de Jesus Cristo,

Estivestes com Ele nos inícios

Da Sua vida e da Sua missão;

Mestre O procurastes entre a multidão,

Assisteste-l’O levantado da terra,

Consumado para o sacrifício único eterno,

E tivestes perto João, Vosso filho;

Acolhei desde o princípio os chamados,

Protegei o seu crescimento,

Acompanhai na vida e no ministério

Os Vossos filhos,

Ó Mãe dos sacerdotes. Ámen!


Arnaldo Vareiro

1 comentário:

  1. Teresinha - Lapa - Póvoa de Varzim29 de julho de 2009 às 01:12

    Quem escreve assim, só pode ter muito pra dar e vender(figurativo),faz-me pensar e meditar que a vida de João Maria Vianey, se assemelha e identifica com muitos jovens de hoje,na prespectiva dos tempos actuais,e precisam deste exemplo para continuarem com a sua persistência lutar para atingirem o seu objectivo.De facto é preciso se ter serenidade e fé.Também me alerta que um Pastor sózinho não pode levar as suas ovelhas a repousar em campos verdejantes se forem irreverentes ou fugirem, e isso cabe a cada um de nós também ser mansos e humildes de coração, para estarmos receptivos ao chamamento da escuta do nosso Pastor e não nos deixarmos levar pelo eco da voz.Espero ser um ano de muita paz e serenidade para todos os sacerdotes e seus paroquianos e que sejam lançadas muitas e boas sementes para darem muito e bom frutos.Nada se faz sem trabalho e essa é a missão da Igreja, trabalhar muito na oração comunitária,lembrando tempos primitivos,pois a união faz a força e onde dois ou três estiverem reunidos em Seu nome,Ele está no meio de nós.

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