quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

QUARESMA EM "LOUVOR PERENE"

No passado dia 2 de Fevereiro, o Senhor Arcebispo Primaz dirigiu à Igreja de Braga a Nota Pastoral “Louvor Perene”, querendo marcar as comemorações dos 300 anos do Lausperene na Arquidiocese, que, segundo dados históricos, começou no tempo do Arcebispo D. Rodrigo de Moura Teles, concedido pelo Papa Clemente XI em 12 de Outubro de 1709. Foi concedido primeiramente apenas à cidade de Braga, estendendo-se a toda a Arquidiocese aquando do 3º Congresso do Apostolado da Oração, realizado em Braga de 15 a 19 de Maio de 1957. Celebrar esta efeméride em pleno Ano Sacerdotal, é, refere D. Jorge Ortiga, “um dom de Deus, uma graça especial que merece a atenção de todos: pastores e fiéis. Somos convidados a dar graças pela imensa riqueza que, ao longo de três séculos, a Igreja Arquidiocesana recebeu com a sucessiva e contínua celebração do Lausperene. Mas somos também convidados a pensar que a Eucaristia é para o Sacerdócio e o Sacerdócio para a Eucaristia. Dois mistérios, dois sacramentos que tiveram a sua origem na Quinta-Feira Santa, no Cenáculo em Jerusalém. Jesus, Único e Eterno Sacerdote, quis perpetuar a Sua acção santificadora e salvífica através dos sacerdotes em Eucaristia.”
Temos vindo nos últimos números do nosso jornal a olhar para S. João Maria Vianney, modelo de vida sacerdotal, em várias facetas da sua vida. Neste mês, e em consonância com a proposta do nosso Arcebispo, convido-vos a olharmos para o Cura d’ Ars e a sua relação íntima e profunda com Jesus-Eucaristia.
S. João Maria Vianney “Não quereria ser pároco, mas estou muito contente de ser sacerdote para poder celebrar Missa” – disse o P. Vianney numa ocasião. Passava longos momentos ajoelhado, de mãos juntos e os olhos fixos no sacrário da pobre freguesia de Ars.
Em 1827, um pequeno estudante, que mais tarde chegou ao sacerdócio, ajudava-o como menino de coro e deixou este testemunho: “Estava admirado de o ver permanecer cinco minutos depois da consagração com as mãos e os olhos levantados, numa espécie de êxtase. Nós dizíamos, os meus companheiros e eu, que ele via a Deus. Antes da comunhão, parava alguns momentos; parecia conversar com Deus.” Muitos eram os que acorriam a Ars somente para o admirarem durante a celebração da Santa Missa, pois diziam que parecia-lhes ver “um anjo no altar”. Chorava durante quase toda a Missa. O exterior reflectia o que se passava no mais íntimo da alma: não fazia gestos exagerados ou inúteis; os seus olhos oravam ou contemplavam, ora elevados, ora baixos; as suas mãos suplicavam postas ou estendidas. Era uma pregação muda de uma eloquência sublime! Tudo nele respirava adoração!
Certa manhã, atormentava-o de tal modo o pensamento do inferno e o medo de perder a Deus para sempre, que gemia interiormente: “Ao menos deixai-me a Virgem Santíssima.” Durante uma Missa de Natal, à meia-noite, cantou-se depois da elevação um hino bastante comprido. Segundo o rito lionês, o celebrante devia, a partir de certo momento, sustentar a hóstia consagrada sobre o cálice até ao Pai Nosso. Então, conta uma testemunha, “vi como olhava aquela hóstia, ora com lágrimas, ora com um sorriso. Parecia falar-lhe; depois vinham as lágrimas e em seguida os sorrisos.” Depois da Missa, pedimos-lhe desculpa na sacristia por o termos feito esperar tanto tempo. “O tempo passou sem que me desse conta”, foi a resposta.
- Mas, Sr. Cura, que fazia quando tinha a hóstia consagrada nas mãos? Parecia estar muito comovido.
- Com efeito, ocorreu-me uma ideia feliz – respondeu o santo - Dizia a Nosso Senhor: Se soubesse que hei-de ter a desgraça de não Vos ver na Eternidade, visto que agora vos tenho nas mãos, não Vos largaria mais!”
Celebrar a Eucaristia em Igreja, Povo Sacerdotal e reunido pela Palavra de Deus, é celebrar a aliança entre o Esposo, Jesus Cristo, e a Sua Esposa, a Igreja. Saibamos neste tempo da Quaresma, a exemplo do Santo Cura de Ars, a não largarmos Jesus, Pão vivo descido do céu, mas a permanecermos em comunhão vital com Ele, que, cada dia na Eucaristia, cria e recria a Sua Esposa e a une consigo. A Quaresma deste Ano Sacerdotal seja um “Louvor Perene”, um “perder-se” no Esposo, que faz circular o Seu Sangue, a Vida Nova, em cada um de nós!
Arnaldo Vareiro

O CAMINHO DA QUARESMA

A celebração da Páscoa, como qualquer “tempo forte” da liturgia, é precedida por uma preparação intensa de conversão, chamada QUARESMA.
A palavra Quaresma (Quadragesima) quer dizer quarenta dias. Ao longo deste período revivemos os quarenta dias de Cristo no deserto e os quarenta anos de peregrinação dos israelitas pelo deserto até chegarem à terra prometida.
Com efeito, durante quarenta dias, Jesus prepara-se no deserto para o seu imediato ministério público, enfrentando as tentações e renovando a relação íntima com o Pai. Durante quarenta anos, o povo conduzido por Moisés, depois de sair do Egipto, a terra da escravidão, sofreu fome e sede; às vezes, sucumbiu face ao desânimo mas, antes de mais, viveu a experiência única da ternura de Deus (Ex 12-40).
É exactamente esta experiência de intimidade com Deus que todos os crentes devem reviver ao aproximar-se a Páscoa, para chegar com “a alegria de um coração purificado” à renovação das promessas realizadas no Baptismo, que é a aliança pessoal de cada cristão, e se encontrar profundamente com Cristo morto e ressuscitado na Eucaristia.
A nossa Arquidiocese de Braga continua a viver o seu programa pastoral “Tomar conta da Palavra que toma conta de nós”. Neste ano somos convidados a “Acolher a Palavra”. A Quaresma de 2010 deve ser para o povo de Deus um desafio exigente que o sensibilizará para escutar e acolher melhor o chamamento do Senhor, que nos convida à conversão.
Antigamente, no começo da Quaresma, a Igreja insistia mais nas modalidades da penitência; hoje, antes de mais, assinala-nos o seu objectivo me significado.
Mais do que o como fazer penitência, é importante saber o porquê, para que esta não se transforme numa prática superficial que não produz os frutos de conversão desejados.
A penitência da Quaresma orienta-se para Deus, a quem a honra, e para os irmãos, a quem consola. Nela se expressa com grande força a opção pessoal do discípulo de Jesus pelo duplo mandamento do amor: amor aos irmãos porque amamos o Pai misericordioso e cheio de ternura.
Mais do que uma ascese artificial e um mero cumprimento de preceitos, a Quaresma propõe a todos os homens que se esforcem por rever leal e sinceramente a sua maneira de ser, por descobrir onde se encontram no projecto que Deus tem para eles, o que é que querem e o que perceberam da vida cristã. Estes quarenta dias vividos com Israel no deserto, com Moisés, Elias e, sobretudo, com Cristo, são um período profundamente espiritual. Sabemos que devemos enfrentar a tentação, mas também sabemos que somos capazes de vencer com Cristo. Por outras palavras: realismo salutar e objectividade para nos reconhecermos pecadores, mas também esperanças renovadas diante da luz nova. Coragem para mudar, assim como para esperar…
Arnaldo Vareiro